Existem várias formas de espalhar o amor pelo mundo. Uma delas é promover a troca de experiências ao aproximar povos, enriquecendo culturas e valorizando nossa ancestralidade. É exatamente isso que tem sido feito por dois ex-participantes da Universidade Viva Inkiri – Alessandro Carvalho, 24, e Diana Paris, 21 – junto ao povo indígena Huni Kuin, que vive no meio da floresta amazônica, fronteira entre o Brasil e o Peru, no município de Jordão, Estado do Acre.
Desde 2015, os ex-unis mantém uma relação muito próxima com esse povo indígena, que num passado não tão distante sofreu muito com situações de abusos, violência e escravidão nas mãos de seringueiros. Agora, a experiência que Ale e Diana adquiriram em Inkiri Piracanga contribui para minimizar e reverter os impactos dessa história.
O povo Huni Kuin é reconhecido internacionalmente pelo seu rico conhecimento, principalmente das medicinas da floresta. Eles são conectados com a Terra e o Divino por meio da música, da dança, dos cantos, das plantas e dos saberes passados através das gerações.
“Logo depois de conhecer os Huni Kuin, em 2015, vim para Piracanga para fazer a Universidade Viva Inkiri e consegui mudar muitas perspectivas em relação a mim mesmo ao viver um período de muitos aprendizados. Consegui me empoderar e reconheci no que era feito em Piracanga como um belo exemplo de ações que poderia levar para o povo Huni Kuin”, afirma Ale.
Hoje, a experiência de Inkiri Piracanga é levada aos Huni Kuin, desde os valores propagados pelo Movimento Awaken Love (honestidade, autorresponsabilidade, gentileza, dedicação, serviço e beleza) até práticas de gestão ambiental e outros conhecimentos, como:
- Construção de banheiros secos ecológicos;
- Técnicas de permacultura;
- Cuidado com os resíduos;
- Reflexões sobre o consumo em excesso de medicamentos;
- Uso de produtos biodegradáveis e cuidado com a água;
- Atenção básica com saúde e alimentação.
O resultado disso é o empoderamento dos índios quanto a sua própria cultura. Segundo Diana, todo o trabalho é feito a partir de muito diálogo. “Buscamos ser uma referência positiva, sempre com muita conversa”, diz.
Para se ter uma ideia, ela explica que os indígenas em alguns casos chegavam a dar leite condensado para bebês de dois meses. “Eles ainda não tinham consciência de como esses alimentos industrializados, que eles não tinham costume de ingerir, poderiam ser danosos à saúde”, exemplifica Diana. “Assim, buscamos estimular uma mudança de dentro para fora e trabalhamos em nós mesmos a aceitação de que há muita coisa que não podemos mudar. Queremos contribuir, mas sem substituir a cultura deles pela nossa”, completa.
‘TEMPO DE CULTURA’
Uma das primeiras ações junto aos Huni Kuin foi a contribuição para a construção de um ponto de cultura no bairro indígena de Jordão. Antes, os jovens já haviam criado um coletivo para compartilhar músicas, arte e histórias de seu povo. “Para participar das atividades, eles tinham regras como não beber ou ficar na rua até tarde. Quando vi isso, quis ajudar e escrevi o edital que culminou na construção da casa e na compra de aparelhos multimídia”, conta Ale. “O local virou uma aldeia urbana onde são realizadas festas e reuniões do povo na cidade”.
Esse trabalho de valorização dos Huni Kuin tem gerado o que eles chamam de “tempo de cultura”. Indígenas que vivem espalhados em diversas regiões têm se reaproximado para trocar experiências e manter a cultura tradicional viva. “Eles são os últimos guardiões da floresta e nós simplesmente buscamos facilitar esse encontro para a valorização desta rica cultura, como é o caso do festival realizado no ano passado”, completa Ale.
FESTIVAL E CAMPANHA
O Festival Nukun Dewe é um momento onde aldeias das três terras indígenas próximas ao município de Jordão se reúnem para fortalecer e difundir sua herança cultural milenar. Na última edição, cerca de 400 indígenas compartilharam músicas, danças, brincadeiras, histórias, rezas e outros conhecimentos.
“O evento amplia os conhecimentos individuais e coletivos por meio da troca de experiências, garantindo aos seus descendentes acesso ao conhecimento tradicional”, explica Diana. “Reuni-los no mesmo local é unir pedaços de uma história de riqueza e conexão profunda com a natureza”.
Este ano, para receber os indígenas com mais conforto e segurança, Ale e Diana estão fazendo uma campanha de financiamento coletivo para:
- Melhorar o acesso a Aldeia Boa Vista.
- Construir banheiros ecológicos que evitem a contaminação das águas e propagação de doenças, de acordo com hábitos locais e padrões básicos de saúde.
- Construir área de cozinha e refeitório para servir mais de 500 indígenas.
- Construir maloca tradicional de palha para hospedagem.
- Subsidiar a logística de transporte e alimentação dos participantes.
- Custear a viagem de anciães e anciões de aldeias distantes.
As melhorias, após o término do Festival Nukun Dewe, se tornarão benefícios permanentes para a comunidade, que utilizará esses espaços para abrigar escolas, sediar reuniões, eventos culturais e encontros.